Fiscalização na Internet em Portugal: quem pode ver o que fazes

Em Portugal não existe vigilância massiva legalizada do que fazes online. O que hÔ são intervenções pontuais e justificadas: investigações criminais com ordem de juiz, reguladores a fazer cumprir leis europeias e bloqueios a sites claramente ilegais. Neste guia explicamos, de forma simples, a fiscalização na Internet em Portugal, quem pode intervir, em que situações e o que podes fazer se sentires que os teus direitos foram ultrapassados.

O essencial, sem confusƵes

Quando hĆ” suspeitas de crime, a polĆ­cia pode pedir acesso a comunicaƧƵes ou a metadados, mas sempre com base legal e, regra geral, com autorização de um juiz. O conteĆŗdo de mensagens estĆ” protegido; o acesso Ć© excecional. Os metadados (quem falou com quem, quando e de onde) tambĆ©m nĆ£o sĆ£o um ā€œlivre acessoā€: tĆŖm regras, prazos e controlo judicial. A investigação de cibercrime Ć© feita sobretudo pela PolĆ­cia JudiciĆ”ria, atravĆ©s de unidades especializadas.

Do lado regulatório, a ANACOM garante que a Internet se mantém aberta e neutra, nada de tarifÔrios que favorecem certas apps, e coordena a aplicação do DSA (Serviços Digitais), que impõe obrigações às plataformas: remover conteúdos claramente ilegais, ser transparente nas decisões e permitir recurso. Por outro lado, a CNPD faz cumprir o RGPD e a lei da privacidade nas comunicações: pode investigar e multar quem recolhe ou usa dados pessoais sem base legal suficiente. Entretanto o IGAC lidera, com os operadores, os bloqueios a sites de pirataria, normalmente ao nível do DNS. Isto corta o acesso ao domínio, não significa que alguém anda a ler o teu trÔfego.

Na cibersegurança, o CNCS define políticas e requisitos para setores críticos, alinhados com a diretiva europeia NIS2. O foco aqui é proteger serviços essenciais e infraestruturas, não vigiar pessoas. Em paralelo, os serviços de informações têm fiscalização própria no Parlamento e o seu acesso a dados é limitado por decisões constitucionais: hÔ travões institucionais.

Exemplos rƔpidos do dia a dia

Imagina que publicam um vídeo de burla com vítimas reais. A plataforma pode removê-lo por violar a lei e as próprias regras, tem de te notificar e permitir recurso, e as autoridades podem pedir dados se existir investigação.

Outro cenÔrio: recebes publicidade por SMS sem nunca teres dado consentimento. A CNPD pode intervir. Tens direito a opor-te e a pedir remoção dos teus dados.

Se ā€œdesapareceuā€ o teu site pirata favorito, o mais provĆ”vel Ć© tratar-se de uma decisĆ£o administrativa no Ć¢mbito do memorando com a IGAC e os ISPs. Trata-se de um corte tĆ©cnico ao domĆ­nio, nĆ£o um espiĆ£o no teu histórico.

O que NƃO existe

NĆ£o hĆ” um sistema de vigilĆ¢ncia permanente do trĆ”fego de todos. As operadoras nĆ£o podem ā€œabrirā€ o teu histórico de navegação só porque sim. E as escutas nĆ£o acontecem sem base legal e sem juiz.

Os teus direitos, explicados simples

Podes pedir às empresas tudo o que guardam sobre ti, exigir correção ou eliminação e recusar marketing direto. Podes reclamar para a CNPD quando vês abusos de dados pessoais. Também Podes queixar-te à ANACOM se uma prÔtica violar a neutralidade da rede. E, no âmbito do DSA, tens direito a ser informado quando um conteúdo teu é moderado, com um canal de recurso dentro da própria plataforma. Se fores vítima de crime online (burlas, sextortion, acesso ilegítimo), denuncia às autoridades.

ā€œComo reclamarā€ (guarda esta parte)

Se o problema disser respeito a dados pessoais ou spam, começa por contactar a empresa e exercer os teus direitos (acesso, oposição, eliminação). Se não resultar, apresenta queixa à CNPD com o mÔximo de evidência possível (prints, e-mails, datas).

Entretanto se for violação da neutralidade da rede ou um conflito com a tua operadora sobre prÔticas que discriminem trÔfego, apresenta reclamação à ANACOM e descreve o plano/tarifÔrio e o comportamento observado.

Por outro lado se detectares pirataria ou uso abusivo de conteúdos protegidos, reporta à IGAC; no caso de crime, apresenta queixa na PSP/GNR (ocorrência) ou na Polícia JudiciÔria (cibercrime), guardando comprovativos, URLs e capturas de ecrã.

FAQ curtinha

A PJ pode ler o meu WhatsApp?

O conteúdo estÔ encriptado ponto-a-ponto. Assim, em regra, não. Só em investigação, com base legal, e frequentemente via apreensão do dispositivo.

Usar VPN Ć© legal?

Sim. DĆ”-te mais privacidade, mas nĆ£o te torna ā€œinvisĆ­velā€ perante uma investigação vĆ”lida.

As escolas/empresas podem monitorizar equipamentos?

Em equipamentos da própria entidade pode haver registo e políticas de uso, mas têm de ser transparentes, proporcionais e cumprir o RGPD.

Bruno Fonseca
Bruno Fonseca
Fundador da Leak, estreou-se no online em 1999 quando criou a CDRW.co.pt. Deu os primeiros passos no mundo da tecnologia com o Spectrum 48K e nunca mais largou os computadores. Ɖ viciado em telemóveis, tablets e gadgets.

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