Foto do Cartão de Cidadão no telemóvel? Este é o verdadeiro risco

Abres a galeria do telemóvel e, algures entre selfies e fotos de jantar, lá está: frente e verso do Cartão de Cidadão, bem nítidos. Talvez até uma selfie a segurá-lo. Parece prático. Na verdade, é um presente embrulhado para qualquer burlão. No entanto é uma coisa que todos fazemos. Eu já recorri a isso quando precisava de dar o número da segurança social e não tinha o cartão comigo. No entanto tem cuidado. Não é um drama gratuito. Hoje em dia, quem roubar ou tiver acesso ao teu telemóvel (ou à tua cloud) pode, com meia dúzia de dados certos, fazer-se passar por ti com uma facilidade assustadora. E a foto do Cartão de Cidadão no telemóvel é exactamente a peça de puzzle que faltava. Vamos por partes.

Porque é que guardar a foto do Cartão de Cidadão no telemóvel parece “inocente”

A maioria das pessoas fazem isto por razões legítimas:

  • pediram uma cópia para um contrato de arrendamento;
  • a seguradora quis uma foto “para o processo”;
  • o clube de futebol do miúdo pediu documentação;
  • tens medo de perder o cartão e “assim está sempre à mão”.

O problema não é tirar a foto é o que acontece depois:

  • fica esquecida na galeria;
  • vai parar ao WhatsApp, ao Messenger, ao e-mail;
  • é automaticamente enviada para a cloud (Google Fotos, iCloud, etc.);

muitas vezes é reenviada para terceiros… que tu já nem lembras quem são.

Ou seja, em vez de estar num só lugar, os dados do teu documento de identificação passam a estar espalhados por todo o lado.

O que é que realmente está naquela foto?

O Cartão de Cidadão não é “só um cartão com o teu nome”. Assim ele concentra quase tudo o que alguém precisa para assumir a tua identidade:

Nome completo, Data de nascimento, Filiação (nome dos pais), Número de identificação civil, Número de contribuinte (NIF), Número de documento, Data de emissão e validade e Assinatura digitalizada.

E, se for uma selfie com o cartão na mão, ainda juntas:

  • o teu rosto (biometria básica)
  • prova de que tens acesso físico ao documento.

Entretanto imagina isto nas mãos de alguém com más intenções. Ou num sistema que sofre uma fuga de dados. Não estão só a ver um “cartãozinho”. Estão a ver um perfil completo de cidadão pronto a ser explorado.

“Mas só tenho a foto no meu telemóvel, isso não chega…”

Chega mais do que pensas.

1. Roubo ou perda do telemóvel

Se alguém roubar ou encontrar o teu telemóvel:

pode abrir a galeria se não tiveres bloqueio forte (ou se o telemóvel estiver desbloqueado na altura do roubo);

pode ver álbuns partilhados, imagens de WhatsApp, screenshots de apps bancárias, IBAN, cartões… e o tal Cartão de Cidadão.

Com isso, consegue:

  • tentar recuperar palavras-passe de contas (usando os teus dados reais);
  • reforçar tentativas de burla com informação “credível” sobre ti;
  • cruzar com dados de outras fugas de informação onde o teu e-mail já tenha aparecido.

2. Cloud e backups automáticos

Mesmo que o telemóvel esteja sempre contigo, a foto pode estar:

no Google Fotos ou iCloud;

num e-mail antigo;

em backups automáticos de conversas.

Se algum desses serviços for comprometido ou usado em dispositivos de terceiros, o teu CC fica lá, direitinho, à espera de ser encontrado.

3. Apps que têm acesso às tuas fotos

Entretanto quantas apps do teu telemóvel já pediram acesso às fotos “para funcionar melhor”? Editores de imagem, redes sociais, apps de impressão de álbuns, etc.

Na prática, isso significa que:

há mais entidades com potencial acesso à tua galeria;

um bug, falha de segurança ou abuso interno pode expor essas imagens.

Não quer dizer que todos o façam mas o risco aumenta.

O que é que alguém pode fazer com a foto do teu Cartão de Cidadão?

Sozinha, a foto não chega para pedir um empréstimo de milhares de euros em teu nome. Mas abre uma porta enorme a vários cenários:

Phishing ultra-credível: burlas por e-mail/SMS em que o burlão sabe nomes, datas, detalhes teus e dos teus pais. Ganha credibilidade e tu baixas a guarda.

Falsos contratos: juntar a tua identificação a contratos de serviços que só descobres mais tarde.

Abusos em plataformas online: abrir contas em serviços, subscrições, até serviços de aluguer, usando os teus dados reais.

Roubo de identidade em contexto de burla: fazer-se passar por ti junto de terceiros (por exemplo, alguém tenta vender algo “em teu nome” e usa o teu documento para ganhar confiança).

E há ainda o “factor colecção”:

Entretanto quanto mais vezes tiras e envias este tipo de fotos, mais locais passam a ter cópias do teu documento. Assim mesmo que a maioria seja legítima, basta um lado menos sério ou menos cuidado para correr mal.

Quando te pedem foto do Cartão de Cidadão

Quando é relativamente normal

Banco, seguradora, entidade oficial reconhecida, processos de arrendamento com contrato formal. Via segura (portal oficial, upload cifrado, etc.).

Mesmo assim, convém confirmar o domínio do e-mail / site (nada de links manhosos); perceber para que é usada a cópia; evitar enviar mais do que o estritamente necessário.

Quando cheira mesmo a problema

Pedem foto de frente e verso + selfie com o cartão… por WhatsApp ou Instagram. Mensagens vagas: “manda só o teu CC para eu tratar disso já”. E-mails de “bancos” com erros de português, domínios estranhos, urgência exagerada. “Promoções” ou “empregos” que exigem logo foto do documento sem explicação.

Regra de ouro:

Se não sabes exactamente quem está do outro lado e porquê precisa do teu documento, não envies.

Já tens fotos do Cartão de Cidadão espalhadas? Faz isto hoje

Não vale a pena entrar em pânico, mas vale a pena agir. Assim em modo check-list:

  • Limpa a galeria
  • Procura por “Cartão de Cidadão”, “CC”, “documento”, etc.
  • Apaga as fotos que já não são necessárias.
  • Verifica o WhatsApp e outras apps
  • Conversas com imobiliárias, seguros, empregos, etc.
  • Apaga as imagens sensíveis (e, se fizer sentido, pede para apagarem do lado deles também).
  • Google Fotos / iCloud: entra, pesquisa por “documento”, “ID”, etc.
  • Move ou apaga o que não fizer sentido estar ali.

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A ferver

Catarina Couto
Catarina Couto
Apaixonada por tecnologia desde que usou o primeiro Nokia com ecrã monocromático, começou a escrever sobre gadgets ainda nos tempos da faculdade. Cresceu entre fóruns, blogs e lançamentos de telemóveis e nunca mais largou o mundo digital. Adora testar novos dispositivos, descobrir truques escondidos nos smartphones e simplificar a tecnologia para quem a usa no dia a dia.

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