Imagina: acordas, pegas no telemóvel e há uma notificação do banco. “Pagamento aprovado – 247,00€” Mas… tu não compraste nada. O coração dispara, o estômago afunda-se, e em segundos percebes. Foste vítima de uma burla. É nessa altura que surge a pergunta que todos fazemos: “O banco devolve o dinheiro em caso de burla?” A resposta devia ser simples. Mas não é.
Antes de mais: nem todas as burlas são iguais
Para perceber se o banco devolve ou não o dinheiro, é preciso distinguir que tipo de burla aconteceu. E aqui está o ponto que muita gente desconhece: o banco só é obrigado a devolver se a transação não tiver sido autorizada por ti.
Traduzindo: se o ladrão usou o teu cartão, o teu MB Way, ou os teus dados sem consentimento e tu não colaboraste (mesmo que sem querer) o banco tem de reembolsar o valor. Mas se houver algum sinal de negligência, tudo muda.

Quando o banco é obrigado a devolver
De acordo com o Decreto-Lei n.º 91/2018 e as normas do Banco de Portugal, há situações em que o reembolso é obrigatório:
Transação sem autorização – o cliente não introduziu PIN, não deu permissão nem partilhou dados.
Roubo ou clonagem do cartão – se o banco não provar negligência, tem de devolver o dinheiro até ao limite do prejuízo.
Erro técnico ou falha de segurança do banco – por exemplo, um sistema de verificação que não funcionou.
Nestes casos, o banco deve devolver até ao final do dia útil seguinte após a notificação do cliente.
Mas atenção: esta regra tem exceções e é aí que começa o pesadelo.
Quando o banco não devolve
Se houver indícios de negligência do cliente, o banco pode recusar o reembolso. E o conceito de “negligência” é mais amplo do que parece. Inclui:
- Ter fornecido códigos de segurança (SMS, MB WAY, e-mails falsos, etc.);
- Teres clicado em links falsos e inserido dados bancários em sites de burla;
- Ter deixado cartões, códigos ou telemóveis sem proteção adequada;
- Não ter comunicado rapidamente a burla ao banco.

Em termos práticos, se o banco conseguir provar que autorizaste indiretamente a operação, mesmo enganado, ele pode recusar devolver o dinheiro.
E é aqui que entra a parte cruel
Os criminosos evoluíram. Já não te pedem apenas o número do cartão. Assim agora mandam mensagens idênticas às do teu banco, com o mesmo logótipo, mesmo tom, mesmo número. Muitos ataques são indistinguíveis de comunicações reais, e mesmo assim, aos olhos da lei, é considerado “negligência do cliente”.
Ou seja: o banco entende que foste tu que entregaste os dados — e que, por isso, a culpa não é dele.
O caso das burlas MB Way
É aqui que a confusão explode. Muitos clientes foram enganados por mensagens ou chamadas falsas do MB Way, onde os burlões pedem para “confirmar a conta”. O cliente segue as instruções e, sem perceber, autoriza uma transferência legítima — só que para o burlão.
Nesses casos, os bancos normalmente não devolvem o dinheiro, porque a transação se autorizou. Mesmo que o cliente tenha sido enganado.
O que dizem os bancos (e o Banco de Portugal)
O Banco de Portugal tem uma posição clara:
“O cliente deve adotar as medidas necessárias para proteger os seus dispositivos e credenciais de segurança.”
Traduzindo: se fores vítima de engenharia social, ou seja, se alguém te enganar para introduzires dados verdadeiros, a culpa é tua aos olhos do sistema.
Há exceções, claro. Se houver provas de que o banco não cumpriu os protocolos de segurança, ou não te alertou para o tipo de burla, podes reclamar. Mas prepara-te: é uma luta demorada.
Como te protegeres e o que fazer se acontecer contigo
- Nunca cliques em links de e-mails ou SMS do “banco”.
- Ativa alertas por SMS/push para todas as transações. Assim reages rápido.
- Se fores burlado, bloqueia o cartão imediatamente e liga para o banco.
- Faz queixa na polícia. Sim, é essencial para formalizar a ocorrência.
- Contacta o Banco de Portugal se o banco recusar o reembolso. Há um processo de reclamação online.
- Guarda tudo, ou seja, prints, e-mails, conversas. É a tua prova de boa-fé.
Como apresentar uma reclamação
Preenche o formulário no Portal do Cliente Bancário (Banco de Portugal).
Anexa provas (extratos, prints, e-mails).
Se possível, envia também cópia da participação feita à PSP ou GNR.
E insiste. Há casos em que a devolução se faz após meses de disputa especialmente quando o banco não demonstrou medidas adequadas de segurança.
